Cidade Digital atraiu empresas e impulsiona economia das cidades



Diferentemente das dificuldades enfrentadas pelo município no final dos anos 90 com uma crise econômica e social, a cidade de Piraí (RJ) tem atualmente a maior parte das riquezas geradas pelas indústrias. Elas são responsáveis por 64% Produto Interno Bruto (PIB) do município ou R$ 415,9 milhões. Ao priorizar as áreas de tecnologia da informação e de comunicação, a cidade do sul fluminense conseguiu reverter o quadro a atrair diversas empresas para a região.

"Nosso município passou por um momento grande de estagnação econômica, mesmo estando às margens da [Rodovia] Dutra, faltavam políticas para atração de empresas", explica o coordenador-geral do Piraí Digital, Gustavo Tutuca. "Tínhamos muita dificuldade de comunicação na cidade. Para você ter uma ideia, a prefeitura tinha duas linhas de telefone. Se a prefeitura tinha duas linhas, imagina o resto da população", ressalta o então prefeito da cidade, em 1997, Luiz Fernando Pezão, atual vice-governador do estado do Rio de Janeiro.

O setor de serviços, onde está concentrada a maioria dos empregos, vem em seguida na contribuição para o PIB, com R$ 230,1 milhões (35%). Na agropecuária, se produz R$ 5,8 milhões (1% do PIB). Os dados, de 2007, são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O PIB per capta da cidade era, em 2007, de R$ 30.888, o décimo maior do estado do Rio de Janeiro. Dez anos antes, no entanto, em 1997, a cidade estava em uma situação econômica bastante diferente. A pequena população da cidade, cerca de 22 mil habitantes, era um empecilho para a ampliação da comunicação no município. O baixo número de consumidores afastava as empresas de telecomunicações de instalarem serviços como internet banda larga na localidade.

As poucas empresas instaladas no município, no final dos anos 90, passaram a demitir. Com a privatização da empresa energética Light, mais de mil postos foram cortados na cidade. A Companhia de Papel, instalada no município, também reduziu seu quadro em quase mil empregados. Em uma população de cerca de 20 mil habitantes, o impacto foi grande.

"Para voltar a atrair empresas, a gente esbarrou nessa questão da comunicação. E, com o projeto digital, demos um grande salto. Hoje, já não é mais um empecilho", diz Tutuca. A ideia do prefeito era criar sua própria rede de internet. Cobrar das empresas um preço pelo acesso, menor que os cobrados pelas teles, e, com os recursos obtidos, bancar o acesso à rede a toda a população da cidade.

"Só que eu não consegui legalizar essa rede. Fomos desenvolvendo aos trancos e barrancos e no final, a Anatel [Agência Nacional de Telecomunicações] não deu licença para comercializarmos essa rede", explicou. "Chegaram a propor que eu leiloasse o que já tínhamos construído da rede", completou.

A autorização da agência veio logo em seguida, mas com a exigência de que a prefeitura fornecesse a banda larga sem cobrar nada pelo serviço. A solução então foi a cidade arcar com todos os custos da instalação e da manutenção do acesso a internet. O preço total para a criação de toda a infraestrutura da rede foi de R$ 3 milhões, com uma manutenção mensal de R$ 75 mil.

Sem condições financeiras de bancar o acesso gratuito a toda a cidade, a prefeitura criou diversos telecentros em boa parte do município, onde o uso de computadores e internet são gratuitos. Em todas as escolas, foram instalados pontos de acessos para os alunos. Ao redor dos telecentros é possível se conectar via wifi (internet sem fio) gratuitamente.

Hoje o município é praticamente todo coberto pela rede wifi construída pela prefeitura. Várias empresas instalaram-se em Piraí: a cervejaria Cintra, a indústria de componentes de computadores IMBP, e a fábrica de fraldas e absorventes Aloés Aloés.

Atualmente, Piraí registra o oitavo melhor desempenho entre os 92 municípios do Rio nas áreas de saúde, educação, e emprego e renda, de acordo com pesquisa da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), divulgada em 2009.

PARA ESTUDANTES, COMPUTADOR E INTERNET SÃO TÃO COMUNS QUANTO CADERNO E LIVRO

O convívio dos estudantes da cidade de Piraí, no sul fluminense, com laptops conectados à internet tornou o mundo digital corriqueiro para as crianças. No vocabulário dos alunos, palavras que antes eram desconhecidas, como web e download, passaram a ser usuais. A relação dos estudantes com o ensino também mudou profundamente. Em períodos sem aula, muitos começaram a sentir falta da escola.

"Nessas férias teve o carnaval. Eu pulei carnaval, mas fiquei em casa sem graça porque eu queria vir para a escola. Quando começaram as aulas eu fiquei feliz", conta a estudante Ana Alice, de 11 anos, que estuda na Escola Rosa da Conceição Guedes.

Alice não tinha computador e muito menos internet em casa. Há cerca de dois anos, na 3ª série, ela começou a usar os equipamentos digitais na escola. Hoje, desinibida, aprova as mudanças e mostra, com muita agilidade, como usar o laptop estudantil, com o sistema operacional Linux (de código aberto).

Ela destaca que as suas notas melhoraram e que o computador facilitou muito as pesquisas necessárias para os trabalhos. Ana Alice conta, no entanto, que os jogos e as redes sociais na internet são suas atividades prediletas.

"Quando eu entro na internet, gosto de jogo de matemática. Eu gosto de mexer no Orkut também, mas às vezes não pode, daí eu não mexo, com medo de o professor brigar", diz.

Percebendo as preferências dos alunos, os professores começaram a mudar também a maneira de ensinar. "Uma professora de inglês, por exemplo, fez com que os alunos enviassem as respostas daquilo que ela estava trabalhando em sala para o Orkut dela", relata a diretora da escola, Lea Maria Peixoto.

A professora de educação física Alexandra Fernandes Faria vê nos computadores com acesso à web a possibilidade de deixar de fazer, na maioria das vezes, apenas atividades esportivas com as crianças. Agora, a teoria pode ser explorada também.

"As coisas só melhoraram com os computadores. A gente não tinha livros da disciplina. É muito difícil uma escola que tem conteúdo de educação física nos livros. No nosso caso, são livros de regras, enciclopédias mais caras, que falam sobre nutrição, sobre a importância da atividade física, que a gente não tem, e nunca teve. Agora eu passo o site, e eles acessam", explica.

Rodrigo Pinto da Silva, 13 anos, é um dos alunos monitores da escola. Além de usuário da rede, ele ensina os mais novos a lidar com as novidades digitais. Sabe até quais são as dúvidas mais comuns em cada uma das séries. Os mais novos têm mais dificuldades com os programas de edição, os mais velhos, com a internet.

Ele aprova totalmente a nova realidade na escola. A experiência com os computadores já faz o aluno vislumbrar uma profissão no ramo. "Eu pretendo fazer programação, ou ser engenheiro. Já tento procurar [informações] sobre essas profissões na internet, tento desenvolver demonstrações, até para colocar na rede", diz.

De acordo com a prefeitura, até o final do mês de março, todos os alunos da rede pública da cidade terão um laptop com conexão à internet.

LAPTOPS PARA TODOS OS ALUNOS

A primeira cidade a distribuir internet banda larga gratuita aos moradores, a pequena Piraí, no sul fluminense, terá, até o final do mês de março, todos os 6,2 mil alunos da rede pública equipados com computadores portáteis. Segundo a prefeitura, será uma das únicas cidades brasileiras onde cada aluno terá um laptop.

A distribuição gratuita dos computadores portáteis – com conexão à rede mundial de computadores – aos estudantes amplia o programa de inclusão digital da cidade, que já disponibilizava internet grátis em todas as escolas e em todos os prédios públicos. A rede cobre uma área de 520 quilômetros quadrados, praticamente todo o município, que tem cerca de 22 mil habitantes.

A decisão de investir em inclusão digital já começou a mostrar os resultados. A escola pública Professora Rosa Conceição Guedes, onde os alunos já dispõem de laptops com internet há quase três anos, subiu no ranking do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), do Ministério da Educação (MEC). Saiu da nota 2,6 para 4,2 na última avaliação (2007). O resultado era previsto para 2015.

Além dos efeitos positivos na educação, o município inicia agora o uso do sistema digital na área da saúde. Todos os agendamentos de consulta, marcações, resultados de exames e diagnósticos, por exemplo, são incluídos num banco de dados centralizado que pode ser aberto pelos médicos de qualquer localidade. Os problemas mais graves são debatidos pelos médicos locais com professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) em teleconferências via internet.

"Isso facilita até para a pessoa não ficar pegando remédio duas vezes, para ficar pedindo exame duas vezes", explica o coordenador-geral do projeto Piraí Digital, Gustavo Tutuca.

Piraí ficou conhecida no final dos anos 90 por ser a primeira cidade do país a enfrentar a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) para poder distribuir internet aos moradores. O município, localizado às margens da Rodovia Presidente Dutra, não tinha então nenhum provedor banda larga. A prefeitura obteve autorização para disponibilizar a conexão aos moradores, desde que fosse gratuita.

Sem poder cobrar pelo uso da internet, nem mesmo uma "taxa social", a prefeitura teve de
arcar com os custos e diminuir a abrangência do projeto. Agora, espera que, com o Plano Nacional de Banda Larga, os preços dos pontos de internet comprados pelo município diminuam.

"A procura por serviços aumentaram muito, a ouvidoria municipal, o serviço de impostos, a questão da utilização de e-mail, das reclamações via e-mail para a prefeitura, as solicitações via e-mail. Tudo isso tem ajudado muito na comunicação e na integração", ressalta o coordenador.



Agência Brasil
Bruno Bocchini - Enviado especial
Talita Cavalcante e Juliana Andrade - Edição

[Fonte]



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